Porque ainda Angola continua um pais pobre.



Isabel dos Santos é apresentada pelo regime como uma heroína, diz a Forbes QUINTILIANO SANTOS/NOVO JORNAL/ARQUIVO

Em Janeiro, a revista Forbes considerou Isabel dos Santos, a filha mais velha do Presidente angolano José Eduardo dos Santos, como a mulher mais rica de África. Agora, publicou uma investigação em que clarifica a origem da sua fortuna: vem de ficar com uma parte de empresas que querem estabelecer-se em Angola ou da providencial assinatura do pai numa lei ou decreto.
O artigo é assinado por Kerry A. Dolan, uma das coordenadoras da lista anual dos milionários, e pelo jornalista e activista angolano Rafael Marques, que dizem ter falado com muita gente no terreno e consultado muitos documentos. No entanto, Isabel dos Santos e o empresário português Américo Amorim – que se tornou um importante parceiro da filha do Presidente angolano –, entre outros visados directamente, não falaram com os jornalistas.

A empresária veio desmentir as afirmações da Forbes. Em comunicado, o seu gabinete diz que o artigo é obra “um conhecido ativista político que, patrocinado por interesses escondidos, passeia pelo mundo a atacar Angola e os angolanos”, referindo-se a Rafael Marques. “Isabel dos Santos é uma empresária independente e uma investidora privada, representando unicamente os seus próprios interesses”, sublinha o comunicado.
A revista norte-americana diz claramente que a história de Isabel dos Santos, a milionária de 3000 milhões de dólares no país onde 70% dos habitantes vivem com menos de 2 dólares por dia,“é uma rara janela para a mesma trágica narrativa cleptocrática em que ficam presos muitos outros países ricos em recursos naturais”.
José Eduardo dos Santos, de 71 anos, é Presidente de Angola desde 1979, e é o chefe de Estado que governa há mais anos sem ser monarca, sublinha a Forbes. Incluir a sua filha em todos os grandes negócios feitos em Angola é uma “forma de extrair dinheiro do seu país, enquanto se mantém à distância, de maneira formal”, escrevem os jornalistas. “Se for derrubado, pode reclamar os seus bens, através da sua filha. Se morrer enquanto está no poder, ela mantém o saque na família.”
Isabel dos Santos tem 24,5% da Endiama, a empresa concessionária da exploração mineira no Norte do país – criada por decreto presidencial, que exigia a formação de um consórcio com parceiros privados. Os parceiros privados da filha do Presidente, que incluíam negociantes israelitas de diamantes, criaram a Ascorp, registada em Gibraltar. Na sombra, diz a Forbes, citando documentos judiciais britânicos, tinha o negociante de armas russo Arkadi Gaidamak, um antigo conselheiro do Presidente angolano durante a guerra civil de 1992 a 2002.
O escrutínio internacional dedicado aos ‘diamantes de sangue’, explica a revista, aconteceu no mesmo período em que Isabel dos Santos transferiu a sua parte do negócio, que a Forbesclassifica como “um poço de dinheiro”, para a mãe, uma cidadã britânica. Tudo continua em casa, sublinha a revista.
Além dos diamantes, também a posse de 25% da Unitel, a primeira operadora de telecomunicações privada em Angola, partiu de um decreto presidencial directamente para a filha mais velha. “Um porta-voz de Isabel dos Santos disse que ela contribuiu com capital pela sua parte da Unitel, mas não especificou a quantia; um ano depois, a Portugal Telecom pagou 12,6 milhões de dólares por outra fatia de 25%”, escreve a revista.
A quota-parte de 25% da Unitel detida por Isabel dos Santos é avaliada por analistas que seguem a actividade da PT, e que foram ouvidos pela Forbes, em mil milhões de euros.
A parceria com Américo Amorim, que abarca as áreas financeira, através do banco BIC, e petrolífera, através da Amorim Energia e dos seus negócios na Galp e com a Sonangol, tem sido um sucesso. A revista lembra o investimento de 500 milhões na portuguesa ZON e explica também como Isabel dos Santos acabou por ficar à frente da cimenteira angolana Nova Cimangola, também através de negócios com Américo Amorim.
Contas feitas, o objectivo do regime é apresentar Isabel dos Santos como uma heroína angolana. Depois de a Forbes a ter declarado uma bilionária, em Janeiro, o Jornal de Angola, “porta-voz do regime, declarava ‘estamos maravilhados por a empresária Isabel dos Santos se ter tornado uma referência do mundo das finanças. Isto é bom para Angola e encher os angolanos de orgulho.’”. Mas não é caso para isso, diz a revista: “Os angolanos deviam ficar envergonhados. Não orgulhosos.”

Comentários

  1. Infelizmente, parece que Angola adoptou o mesmo esquema que a Argentina. Quando o Ex-Presidente Néstor Kirchner saíu do poder deu lugar à então primeira-dama e mulher - Cristina Kirshner, que está no poder desde 2007.

    Ao mesmo tempo que produz um Guevara é, até hoje, um dos poucos países do mundo em que virtualmente toda a gente é partidária de uma das mais imaginativas formas de fascismo no seu sentido mais restrito que é o Peronismo.

    Angola, vai precisamente pelo mesmo caminho, mas é, a meu ver, mais grave. Trata-se de uma política parcial, sem visão social ou de desenvolvimento do país a nível interior. Ela investe em todo lado menos no país dela, com o falso pretexto de levar Angola além fronteiras com vista ao crescimento e ao reconhecimento internacional, quando a verdade é que Angola precisa primeiro de ter barrigas cheias, crianças saudáveis, condições de saneamento básico, acesso a àgua potável e não de ter várias parcerias empresariais com Portugal e o resto do mundo, que não dão nada ao povo, enquanto enchem os bolsos desta corrupta.

    Quando se pretende Governar um país, à partida, deve-se começar por reformas estruturais que visem o desenvolvimento e o aproveitamento do que é nacional, e Angola, como tantos países africanos, é excepcionalmente rica e a Isabel e o pai também são, portanto, não é por falta de verba.

    Com o andar da carruagem, já estamos a olhar para o novo Dubai, pelo menos em Luanda, em que o preço de uma porcaria de uma coca-cola custa mais do que muita gente ganha para por comida na mesa. Um Dubai feito na base da ilusão do superficial, casas bonitas e muito emprego para os estrangeiros, quando o núcleo do país continua pobre e podre de tão abandonado.

    Ainda agora estava a ver o Anthony Boudain - No Reservations, programa sobre gastronomia mundial que dá na sic radical. Ele estava em Moçambique, e deparado com um hotel abandonado, considerado em 55 o orgulho de África, questiona o porquê da situação, ao qual o Presidente indica que por falta de investimento exterior não tinham como manter o hotel, e com a guerra cívil foi tudo mais complicado. ÁS tantas, ele entrevista dois ingleses que ainda viram o hotel na sua glória e acabam por dizer "era lindo, luxuoso, mas agora está abandonado e cheio de ocupantes ilegais (moçambicanos sem-abrigo desde a guerra) que só estragam a beleza do que sobrou".

    Este hotel é hoje habitado por 3000 pessoas, que desde a guerra civil, que durou 16 anos, se ali abrigaram, não tendo qualquer outro sitio para ir ou qualquer outra forma de melhorar as condições deprimentes em que vivem.

    Acho abominável alguém conseguir fazer um comentário destes e é, precisamente, por isto que África não ganha um lugar merecido no mundo.

    Enquanto as pessoas acharem que fazer turismo ao lado de crianças com fome, que tomam banho na mesma água em que defecam, nada muda, são tão culpados como os que criam e alimentam a miséria.

    Para quê a revolução Angola? Era para ser livre ou para dar lugar a outro ditador? A outra forma de colonização? A colonização de costumes e religião deu lugar à colonização da pobreza. A escravatura não acabou só mudou de ramo e de modus operandis, e o povo parece não ter força para lutar.

    Sem me alongar mais, uma questão:
    Os EUA estão sempre em todas com o falso pretexto da libertação dos povos oprimidos, engraçado não prestarem muita atenção à miséria e à fome que impera neste continente tão rico e tão massacrado. A resposta é que, provavelmente, a Isabel já lhes dá tudo de mão beijada, logo não ha desculpas esfarrapadas para intervirem.

    O culpado é sempre o Comunismo.

    Desculpa escrever tanto Dino.

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  2. Elia, considerções como estas são sempre bem vindas, aliás acho que já respondeste á questão com este pequeno resume, sendo assim já me poupaste trabalho.

    Obrigado por esclareceres aqui o que se passa em Angola e não só.
    Continuemos sempre atentos.

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